21 de julho de 2013

I am

[adriano sodré]

primeiro o desconforto de perguntar na livraria pelo livro da mulher de A. haverá algo pior que perdermos a identidade, não sermos nada a não ser a imagem, o duplo daquele com quem partilhamos a casa, a comida, a cama, o sexo? depois o riso, logo às primeiras linhas, por todas as coincidências, a pausa, a loucura que em mim nunca chegou a ser, o desejo de fuga para longe dos objectos que magoam pelo simples facto de existirem, a máquina do café, o comando da televisão, um frasco de perfume, a escova de dentes, um ou outro livro. as coincidências [note to self: não comprar um livro sem ler a breve discrição da contracapa], o riso e a troca de mensagens que motivou. é tão fácil contarmos a nossa vida a quem não conhecemos. a história de mia podia ser a minha, talvez até seja, em ambos os casos não sei como acaba. ou sei e não quero pensar nisso, tal como a mia. há nesta mulher uma mistura de "raiva, ódio e amor" que me são familiares. há em mia uma tentativa de lidar com a vida com humor, com um sorriso, mesmo que à noite as lágrimas deixem a almofada a precisar de ser torcida. o sorriso que se ensaia a cada hora, a procura da gargalhada fácil a cada momento do dia. só o humor [amor] nos pode salvar. há nesta mulher uma procura por respostas que não existem, num contrabalançar de assunção de culpas e acusações, estas num crescendo na exacta medida em que vou virando páginas, na exacta medida em que as horas se transformam em dias. 'o tempo não está fora de nós, está dentro.' mia transformada num anagrama: i am. tal como eu.

[second note to self: há livros que nos encontram nas melhores e piores alturas. é mergulhar neles]