[DR]
estou a sair da junta, de calções e t-shirt, ainda
que sem decote, quando oiço, já depois de atravessar a estrada, nas minhas
costas: 'eu agora não posso comer
coisas gordas. olha para isto, um espectáculo!'. segui em frente, mantive a
compostura, ainda que com dificuldade, mas não resiste a soltar uma gargalhada ao
entrar no carro. ocorreu-me depois que a Maria Rita escreveu em tempos sobre o
assunto e como na altura me senti tão longe daquela realidade. nunca me senti
ameaçada, ou mesmo assediada na rua, talvez porque nunca tenha vivenciado as
experiências que ela descreve, nem aos 12, nem aos 20 ou aos 30. na altura
li-a, e aos comentários que motivou, e senti estar a viver numa realidade
paralela. isso não evita que concorde com as muitas opiniões que ali foram
partilhadas e de como questões culturais deixam que as mulheres sejam abusadas,
mesmo que só com o olhar, com casos extremos de violações em que juízos de um
único neurónio-em-coma conseguem sugerir que 'ela estava a pedi-las' por vestir
desta ou daquela maneira. hoje fiquei a pensar o que faz de mim diferente? não
sou uma mulher feia, longe disso, tenho elegância para dar e vender, mas sempre
me senti segura [ok, às quatro da manhã no cais sodré, acelero o passo]. e a
única conclusão a que chego é que é uma questão de atitude. sou de tal maneira
despassarada que em 95% do tempo, mais coisa menos coisa, em que ando na rua
nunca me apercebo de quem vai ao meu lado ou o que está a fazer. vou focada a
pensar na vida, quer ela interesse ou não, que se alguém se encosta no metro ou
no eléctrico acho que está com falta de espaço e chego-me para o lado. mas
sempre vou ouvido o que se passa à volta, e se o piropo é bom, e hoje foi, não
resisto a dar uma gargalhada.
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