7 de dezembro de 2007

o dia em que o rei abandonou a coroa

Era uma vez o reino do Caos. No trono sentava-se um rei. Era uma sociedade patriarcal, que os analistas geopolíticos tinham descoberto há pouco tempo, era objecto de aturado estudo, faziam-se reuniões ao mais alto nível, e tentava-se a todo o custo descobrir o que tinha corrido mal num reino em que tudo parecia perfeito. Nos corredores das empresas comentava-se à boca pequena que tinha perdido o rumo. O rei e os príncipes controlavam tudo e tinham na polícia, um corpo pequeno, mas autoritário, os seus mais fiéis seguidores. Havia um constante desencontro entre a monarquia e o povo. Raramente estavam de acordo entre si, mas os últimos, subalternos como todos os que estão dependentes da boa vontade dos superiores, aceitavam as regras e as ordens. Por vezes havia pequenos ajuntamentos, grupos de quatro ou cinco pessoas que criticavam, diziam mal, prometiam que um dia emigravam e não voltavam, aquilo não era vida. Mas era só conversa. O povo mantinha-se sereno. Até que um dia, quando as nuvens ameaçavam há muito a capital, quando se sentia no ar o cheiro podre da incerteza, o rei anunciou a sua renúncia. Não deu justificações, arrumou os seus tesouros, despediu-se das aias que choravam copiosamente, e saiu pela porta das traseiras do palácio. O príncipe, inchado nas suas novas funções, redondo por baixo de uma coroa demasiado grande, sem saber o que estava a fazer, sentou-se no trono e começou o seu reinado. No reino aumentou a incerteza, os dias tornaram-se ainda mais cinzentos, a polícia apertou as garras do controlo... não se sabe o que aconteceu ao povo. A última vez que abriram a fronteira os cofres estavam vazios e o povo rondava os postes fronteiriços à espera da primeira oportunidade de escapar.

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