3 de setembro de 2008

A notícia chegou tarde, ia avançada a noite, um carro parado a meio da ponte, o salto e o corpo nunca encontrado. Os amigos comentam à boca cheia que não percebem, que a vida lhe corria bem, o emprego era bom, pagava as contas e ainda sobrava, que miúdas não lhe faltavam, que era de riso fácil, era feliz, aqui param e reformulam, parecia feliz, boa conversa, boa onda, ninguém entende e procuram nas últimas palavras, nos derradeiros actos, uma explicação para o inexplicável. Oiço. Levantam-se os pêlos dos braços, chamam-lhe pele de galinha, sobe um arrepio pela espinha. Vou andar semanas com esta história às voltas na cabeça. E sempre as mesmas perguntas a querer saltar pela boca fora. Quanto conhecemos dos outros? Quando perguntamos, será que queremos realmente saber? É tão mais fácil ouvir um ‘tudo bem’ e passar à frente, coscuvilhar sobre a vida do escritório, falar da mala que se quer comprar, do último livro que seu leu, dizer mal do Benfica, qualquer coisa para não aturar o incómodo da vida dos outros, que para chatices já bastam as nossas. E quanto lemos nas entrelinhas quando as palavras dos outros não saem? Quantas vezes olhamos nos olhos dos outros? O que sabemos do ‘vizinho’ do lado, do amigo do peito, da pessoa com quem partilhamos a cama? Quantas vezes perguntamos como quem quer realmente saber?

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